foto ilustrativa disponível em: https://verbalizandoo.wordpress.com/
Mais um dia se estende. Meus estudos e trabalhos já foram concluídos. Estou voltando para minha casa. Ainda não tenho carro próprio, por isso dependo de transporte público. Eu gosto. Gosto de saber que em um relativamente pequeno retângulo sobre rodas cabem tantas histórias, tantos sentimentos, tantas expressões.
Um dos meus costumes é olhar ao redor e perceber pelas expressões ou gestos o que algumas pessoas estão sentindo: algumas estão alegres, outras cantam e sempre há aquelas que deixam claro que o cansaço do dia as venceu.
Em uma destas observações vejo uma mulher em pé, ruiva, com os olhos distantes olhando o horizonte, e falando alto quase como um pedido de socorro.
“Agora ele deu pra dizer que eu gosto mais do cachorro do que dele, é um doente. ” Diz ela ao seu colega, alto, moreno e cabelos grisalhos que está sentado no banco ao seu lado. Tentei inúmeras vezes não prestar atenção na conversa dela, mas...
“Ele diz que sou vagabunda, que tenho “machos” e o pior é que eu nem dou motivo para isso”. Continua relatando. A cada frase proferida por ela, consigo sentir sua dor. Se torno sua amiga, mesmo sem ela saber quem sou.
O abuso que ela sofre e não percebe, me causa desconforto. Meus olhos que já estão fixos na conversa, hora se arregalam, hora sentem compaixão.
“Nem trabalhar ele me deixa e ainda diz que se eu largar dele vai me matar, medo eu não tenho...”
Minha vontade é ir até ela, e dizer quão corajosa é passando por isso a sei lá quanto tempo, mas que ela não deve aguentar isso para sempre.
Quando ela cita que “ele já comprou “aquilo” para me matar” subentendo que “aquilo” quer dizer uma arma. No mesmo instante percebo que não é apenas um tipo de violência que ela sofre, e que isso já chegou longe demais.
Percebo também que essa mulher que acabei de conhecer faz parta as pessoas que sofrem violência doméstica e psicológica no Brasil. E ainda com a descrição de marido bêbado que ela dá não é difícil de duvidar que ela também sofre violência física.
O ponto que tenho que descer é o próximo. E como se ela soubesse que alguém além do seu colega estava sensibilizado com o seu relato ela termina dizendo:
“Eu só não separo dele porque prometi para a minha sogra que cuidaria dele até o fim...” e com um olhar triste termina “...mas está difícil. “
Saí do ônibus triste. Triste por alguém que não conheço e provavelmente nunca mais irei ver. Triste pela sua história. Triste por saber que tantas mulheres passam por isso diariamente. Triste por ver o machismo tão presente ainda hoje e mais triste ainda por saber que ele está na nossa cidade, atacando nossas mães, filhas, tias, sobrinhas, enteadas, etc.
Moça do ônibus, talvez você nunca leia esse texto, mas acredito que alguém perceberá que também sofre violência, através da sua história.
Tantas outras moças que estão lendo: Não aceitem seus namorados/ companheiros/ maridos menosprezarem vocês. Vocês são incríveis. Vocês têm potencial para o que quiserem. Só precisam perceber isso!
Moças, não se culpem. Eu sei que vocês fizeram todas as vontades deles, mas eles não mudaram. O problema são eles, não vocês.
Moças, não importa se a promessa foi para ele, para a mãe, para a vó ou para o papagaio. Não importa se você fez juras de amor. Não importa se vocês têm filhos juntos. Não aceitem ser violentadas.
Moças, vocês não estão sozinhas!
Violência é crime, denuncie!
Texto: Daiane Cristina
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