Numa rápida pesquisa na internet, é
fácil de encontrar pessoas se posicionando contra a existência de uma “cultura
do estupro”. Alguns posicionamentos colocam essa ideia como um “terrorismo
psicológico do feminismo”, ou, ainda, como simplesmente uma fantasia da
esquerda brasileira. Será mesmo?
Estadão: “Brasil tem 1 denúncia de
violência contra a mulher a cada 7 minutos”. G1: “Médico detido, suspeito de
estupros, tem prisão revogada em Valadares”. G1: “Mulher é encontrada morta com
sinais de abuso sexual em Araras”. Diário de Maringá: “Mulher é estuprada ao
lado do filho bebê em São João do Ivaí”.
Estadão: “Suspeito de estupro coletivo...”. Veja: “Justiça determina
soltura de suspeito de estupro no Rio”. Uol: “Veja quem são os suspeito de
estupro coletivo contra adolescente no Rio”. G1: “Polícia Civil investiga
suposto estupro de menina de quatro anos em Vilhena”
- Se formos pensar que cultura são
todos os hábitos do nosso cotidiano, essas atitudes que cometemos na fala, nos
gestos, na maneira como nos comportamos – e não necessariamente precisamos
pensar para fazer – é possível dizer, sim, que há uma cultura do estupro. Isso
porque as palavras, os xingamentos, as piadas, as músicas, termos, tudo o que
usamos para nos referirmos às mulheres fazem parte de uma aceitação social. A
língua, já que falamos em expressões, ela é fundamental para entendermos o que
é uma cultura de estupro porque constrói nossa cultura. Se formos fazer uma
análise linguística nós podemos afirmar que existe uma cultura do estupro no
Brasil.
Mas, ao contrário do que muitas
pessoas imaginam, a violência contra a mulher – e o próprio estupro – não se
limita apenas como o abuso físico, e, sim, como um ataque moral, psicológico e,
sobretudo, verbal. “A cultura do estupro vai muito além da violência sexual em
si. Ela está implícita em todas as atitudes machistas que acontecem
diariamente, que oprimem e rebaixam as mulheres a algo inferior. É uma cultura
machista. Desde que somos pequenas somos ensinadas a sermos inferiores aos
homens, somos ensinas a sermos Amélia”.
- Isso não é uma coisinha simples, é
algo que é ensinado desde pequeno. Eu havia comentado com você das brincadeiras
tradicionais, como nas festas juninas onde têm aquelas cadeias onde a menina
fica presa, como um objeto, por ordem de um menino, e a única forma dela sair é
beijando ele. Esse tipo de brincadeira é aceito socialmente, e até financia
muitas escolas que só conseguem dinheiro através dessas festas. É absurdo. E
como uma menina se sente numa situação dessa? Ela se sente como um objeto que
pode ser jogado para qualquer canto.
- No Brasil temos uma população
extremamente conservadora e machista, e isso está enraizado. Não tem como falar
de outra forma... até mesmo nas universidades com os universitários, que fazem
essa cultura se proliferar. Um exemplo são as baladas, ‘ah, a guria bebe então
ela pode ser abusada’, isso é um absurdo. Criam-se idealizações da mulher, de
como ela deve ser e como não deve.
- Acredito que a cultura do estupro
existe por situações que eu passei, de assédio. Eu estava num ônibus e um cara
estava com as calças abaixadas quase do meu lado, e muitas pessoas viram mas
ninguém fez nada. Quando saí do ônibus ele ainda foi atrás de mim. Foi bem
complicado. A cultura do estupro existe, e quando eu conto isso as pessoas logo
perguntam qual roupa eu estava usando, como e isso fosse justificar o que o
cara fez.
- Aqui na universidade esses abusos
vão desde os apelidos que você não pede, como ‘flor’, ‘querida’, ‘amorzinho’.
Por que se referem a nossa aparência? Por que você está encostando em mim? ‘Ah,
é melhor você não estudar isso, não é um campo do seu perfil. É muito violento
pra uma mulher’, entende? São muitas as situações de abuso e de opressão que as
mulheres sofrem aqui na universidade. Um professor casado falou das
preferências dele, ‘eu particularmente prefiro a menina com o cabelo comprido,
com um perfume, de vestido’. Pô, eu não pedi sua opinião sobre mim. Por que
você está infligindo sua opinião como homem, o que você prefere, qual seu tipo
de carne preferida? Entre colegas e professores parece que o que prevalece é a
preferência deles de nós como objetos.
E num cenário tão pessimista como o
atual, uma das formas começarmos a mudar o pensamento das pessoas e criarmos
uma sociedade mais igualitária e humana é o feminismo. “Se a gente desejar uma
mudança social, cultural, essa mudança que vejo que está acontecendo em alguns
âmbitos, é imprescindível a gente considerar o feminismo. Ele que faz que haja
essa percepção das mulheres através de uma visão das mulheres.”
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