Bruno voa, livre, leve, sonhador. Bruno é mais do
que apenas sonhar. Bruno realiza, inspira, incentiva e mostra que o mundo é
pequeno perto do quão grande podemos ser.
Caminhando, sem cantar, mas
através das tatuagens escrevendo sua canção, é na porta da sala onde muitas
pessoas entram rabiscar o corpo que ele aparece com luvas e máscara, deixando
apenas os olhos e tatuagens da região do rosto a mostra. Um por um os clientes
entram na sala e conhecem um pouco do talento de Bruno, levando consigo seu
trabalho e o que mais gosta de fazer... Tatuar.
É em um estúdio no centro de
Guarapuava que Bruno, 19, é encontrado. O estilo largado, boné de aba reta, a
camisa larga e mochila nas costas marcam a chegada ao Tiva tattoo, local de
trabalho do tatuador. Todos que entram no lugar não desgrudam os olhos do homem
alto, magro e cheio de estilo que atrai olhares de admiração, estranheza e
dúvidas. Nem todos que chegam ali realmente sabem quem ele é, porque escolheu
ser assim e da graça que vê na vida que leva.
Vida que descobriu aos 13 anos em
uma brincadeira com amigos, onde através de máquinas caseiras uns tatuavam aos
outros. O amigo “tatuador” passou mal e Bruno precisou tomar a frente. Foi do
improviso que nasceu a paixão pela arte. “Eu comecei a tomar gosto, me
interessar”, lembra da época em que tudo começou. E desse gosto nasceu um a um
dos 20 desenhos que possui no rosto, o trevo, guarda-chuva, lábios e palavras
são algumas das tatuagens que descendo com uma caveira desenhada no pescoço nos
mostram o porta desenhos que se tornou.
“Eu não tinha muita ideia de
levar pra frente e nesse momento eu conheci um cara. Acho que era pra ser. Eu
estava desanimado e quando o conheci ele me ensinou algumas coisas e ai não
parei mais”, recorda do momento em que decidiu levar a tatuagem como profissão.
Aos 15 anos tatuar se tornou frequente, os clientes iam até sua casa e faziam
com que hoje ao voltar as memórias um sorriso brote em seu rosto.
Bruno se tornou assim, alegria
estampada e orgulho de ser quem é. Mesmo quando lembra, com um olhar vago e
distante, das dificuldades que passou, principalmente quando precisou decidir
entre estudar e tatuar. Mesmo quando precisou sair de casa aos 16 anos e seguir
sua própria vida. Mesmo quando percebeu o choque no rosto de sua mãe ao ver a
âncora tatuada no rosto do filho, primeira tatuagem que fez na face. Bruno não
desistiu de se tornar quem queria, e foi através disso que alcançou o sustento
que hoje tem para si. “Arrepender não é a palavra, tudo marca a história que
foi, sabe”, afirma.
Cada traço em seu corpo,
piercings, modificações são tratadas como memórias das dificuldades, tristezas
e alegrias vividas. Os olhos tingidos de preto pela técnica eyeball
tattoo, em que se injeta tinta preta na camada de proteção dos olhos, a língua
bifurcada, cortada ao meio, e os alargadores, um em cada lado do nariz, deixam
para Bruno a lembrança de viagens e aventuras para o Rio e Curitiba. Ambas com
apenas dinheiro de ida, um sonho e sem formas de passar muito tempo nas
capitais. O jovem conta as histórias com pausas citando a forma como amadureceu
depois de cair de cara, sem medo nas suas próprias vontades. A voz sempre
constante soltar um riso calmo quando lembra que superou tudo que poderia lhe
impedir de conseguir seus sonhos. “Eu amadureci muito, muito mesmo. Fui criado
de um jeito meio largado e precisei quebrar a cara para aprender e a tatuagem
foi o que me ensinou a não julgar os outros”, conta quando lembra de suas
viagens.
E é nos olhos pintados que Bruno
mais se encontra, neles está à parte modificada de si que mais gosta. Foi em
uma quinta-feira, mesmo sem a crença da mãe no que iria fazer que realizou o
procedimento. “Acho que ela não acreditava muito. Eu viajei 24 horas, trabalhei
uma semana pra ter dinheiro pra voltar para Guarapuava e ele pintou meu olho”,
fala sobre o fato que aconteceu no período de seus 17 anos. O jovem passou
pelas máquinas de vários tatuadores, um deles estava nessa viagem que fez a
Curitiba para bifurcar sua língua. Era na “parceria”, como cita, com um amigo
que iria ao estúdio para o procedimento. O curitibano, seu amigo, com medo
desistiu do processo, deixando Bruno sozinho e perdido na cidade. A dor, os
poucos recursos e falta de conhecimento da grande Curitiba fizeram a procura de
seis horas pelo lugar pra ficar. No percurso a língua sangrava, mas a sensação
era minúscula perto do preconceito das pessoas que se afastavam pouco a pouco.
“Eu ia falar com alguém e as pessoas achavam que eu ia roubar”, relembra a
situação.
“Viver perfeitamente sem depender
de ninguém”, assim Bruno define seu trabalho como tatuador aos 17 anos. Dentre
os sonhos que possui hoje estão comprar carro, tirar carteira, ter seu próprio
estúdio, viajar para fora do país e dar um futuro bom para sua filha de oito
meses. A menina, quando é envolvida em perguntas sobre tatuagem, arranca
sorrisos de Bruno, deixando claro no riso frouxo que é a união de duas de suas
paixões e nas palavras que saem é com certeza: quer e apoiará se a filha se
tatuar. O tatuador construiu sua carreira e foi convidado a trabalhar em
Portugal, na mesma época em que descobriu que iria ser pai. A família formada
por Bruno esteve em primeiro lugar, às aventuras de antes foram
derrubadas pela responsabilidade e a única definição que usa é “a base de tudo
que me tornei, da minha responsabilidade”.
No começo a ideia de ser pai
vinha com a de não ter um salário fixo e o baque de pensar em largar o trabalho
como tatuador e seguir outra carreira. Apoio, força de vontade e otimismo não o
deixaram abandonar o que mais gosta. Bruno aprendeu desde o inicio que na
dificuldade encontraria formas de se reerguer. E foi em uma dessas dificuldades
que realizou mais um sonho: o de ficar suspenso em ganchos. Durante 34 minutos
Bruno deixou sua vida toda passando pela cabeça enquanto a dor da pele rasgada
ia sumindo aos poucos, foi em uma convenção de tatuagens em São Paulo que o
realizou.
Nessas escolhas que para uns parecem estranhos
é que vai se encontrando. Os olhares maldosos são deixados de lado e exprimidos
pelo carinho que recebe de algumas pessoas, outras tem medo de o tocar, mesmo
assim, nada impede com que se orgulhe de ser quem é... “Eu to bem realizado
sabe, apesar de tudo, foi bem na louca. Eu dei sorte na vida, tinha tudo para
acabar com minha vida. Sai de casa cedo, parei de estudar, enchi meu rosto de
tatuagem, aos 17 anos já tinha 14 tatuagens só no rosto. Eu levei muita sorte
na vida, realizei tudo o que queria até agora”, afirma sobre como se sente em
relação a sua vida hoje.
Texto: Sabrina Ferrari
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