Quando
pequena, Mariazinha gostava mesmo era de brincar na rua com os vizinhos. Eles
brincavam de estátua, pega-pega e esconde-esconde, mas por ser menina e a mais
nova de todos, ela era o copo de leite do clubinho.
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Mariazinha pega atrás do carro.
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Salvem o mundo!
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Ela não conta, é copo de leite, não sabe brincar.
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Então me ajudem, eu não quero ser copo de leite.
Os
amigos foram envelhecendo e Mariazinha também, logo passaram a aceitar ela em
todas as brincadeiras. A menina corria e se escondia muito rápido, melhor do
que vários garotos da vizinhança.
A
fase infantil restou por último com ela. Os amigos cresceram e se mudaram,
foram estudar em escolas mais distantes, começaram a namorar e pensar em
vestibular.
Maria
amadureceu depressa sozinha. No ensino médio começou a fazer cursinho também e
se dedicava aos estudos para ingressar em uma Universidade igual seus amigos
conseguiram. Não todos, infelizmente.
Maria
conseguiu. A cota por sempre ter estudado em instituição pública ajudou e dentro
da universidade ela descobriu que esse sistema beneficiário não agrada a todos,
ela já foi olhada de lado por ser cotista. Pior ainda para sua nova amiga
Júlia, uma linda morena que entrou com cota racial.
O
mais importante para Maria na área acadêmica é o debate. Nas aulas ela e Júlia
prestam atenção nos discursos dos professores e aproveitam para discorrer sobre
o assunto das cotas, o racismo que a amiga sofre, o movimento feminista e as diversas
bandeiras que são erguidas por diferentes grupos.
Maria
acredita que é essencial a troca de informações sobre as minorias, sobre política
e assuntos polêmicos, para conhecer e respeitar diferentes visões e o nosso
pluralismo. No entanto, a universitária começou a ver na mídia algumas notícias
sobre a proposta da lei Escola Sem Partido, um projeto que estipula como dever
do professor não debater em sala de aula opiniões religiosas, morais e
políticas, no ensino fundamental e médio.
Uma
das professoras foi indagada sobre o assunto durante uma aula da manhã e além
de Maria, eram poucos os que tinham visto algo sobre o projeto.
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Eu não sei como vai ser a educação se essa lei por aprovada, mas penso em
vocês, os estudantes que vão estar na sociedade sem senso crítico, sem
argumento...
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Nos Estados Unidos não tem uma lei assim?
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Lá tem o que eles chamam de “espaço seguro” dentro das universidades. São
locais sem trânsito de ideias e debates. Aqui vai funcionar assim, o que vai
acontecer é que os alunos vão ficar de fora.
“Eu
não quero ser copo de leite”.
Texto por Marcelo Junior.
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